Caminho de Santiago: escolhas e questões práticas
No final de 2017, decidimos fazer o Caminho Português de Santiago. Maio de 2018 foi o mês de eleição. Decidir fazer o Caminho implicou tomar decisões, fazer escolhas e iniciar um processo de preparação, cheio de questionamentos. Por onde começar? Que caminho fazer? Será melhor definirmos as Etapas, antes de partir? A estas perguntas iniciais, outras se juntaram. O que levar na mochila? Será que vamos conseguir? É sobre este processo do antes, durante e após o Caminho, agora escrito a partir da experiência, que pretendemos falar aqui, esperando que possa ser útil para quem pretende fazer o Caminho, inspirar os indecisos, e ser um momento de boa disposição para todos os/as leitores/as.
conteúdos do artigo
1. Caminho Central Português de Santiago, uma escolha
2. Guia do Caminho de Santiago, é preciso?
3. Credencial do Peregrino
4. A Concha ou vieira
5. “To do list” do que levamos na mochila
6. Sete Etapas… sete (novas) oportunidades
7. A Compostela que certifica o Caminho
1. Caminho Central Português de Santiago, uma escolha.

Quando decidimos fazer o Caminho de Santiago começamos a ler sobre o assunto e escolhemos fazer o Caminho Central Português de Santiago, com início em Ponte de Lima. A escolha foi motivada por dois principais fatores: um de ordem prática, o número de dias de férias que dispúnhamos para fazer o Caminho; e o outro de ordem simbólica, o misticismo da Etapa Ponte de Lima – Rubiães, para alguns a “etapa rainha” devido ao grau elevado de dificuldade e à temível Serra da Labruja. O importante é escolhermos o Caminho e o ponto de partida que é mais adequado e que faça sentido para nós.
Há peregrinos a fazerem o Caminho de Santiago desde o século IX, multiplicando-se as rotas que saem de vários pontos da Europa e se dirigem à Catedral de Santiago de Compostela, onde está o túmulo do apóstolo Santiago Maior. O Caminho Português é apenas mais um dos itinerários, e o Caminho Central Português, pela sua origem na Estrada Real que passava pelo Porto, Barcelos e Valença (utilizada desde o século XIV), assumiu maior importância ao longo dos tempos. A popularidade do Caminho de Santiago, depois de séculos de adormecimento, é retomada apenas na década de 80 do século XX, quando o Conselho da Europa o classifica como o primeiro itinerário cultural europeu e, mais tarde, em 1993, a UNESCO o declara como Património da Humanidade. Esta popularidade veio renovada e ressignificada. Apesar de ser um itinerário de peregrinação com génese religiosa, o Caminho de Santiago é, hoje, muito mais do que isso. É um itinerário espiritual e cultural, um tempo e espaço de reflexão e um percurso de descoberta marcado pela diversidade, uma espécie de Babel política, cultural, linguística e religiosa. É para todas as idades, e os motivos são tantos quantas as pessoas no Caminho. O sentido humanista (e mí(s)tico) do Caminho de Santiago é a sua verdadeira essência.
Ter uma consciência histórica do Caminho dá significado e sentido às coisas, por isso recomendamos que na preparação inicial adentrem a História do Caminho de Santiago e da sua simbologia. Vejam filmes, leiam sobre experiências vividas e procurem literatura sobre o assunto.
2. Guia do Caminho de Santiago, é preciso?

Não faltam livros, guias, sites ou blogues que nos falem sobre os Caminhos de Santiago. A escolha por este livro foi uma casualidade feliz. Uma oferta. Foi com ele que adentramos o Caminho Português e foi a partir dele que escolhemos e organizamos o nosso. Um livro pequeno, com dicas excelentes e uma leitura super simples, que optamos levar connosco, pelo seu potencial descritivo de cada uma das Etapas e pelas informações úteis e práticas que nos disponibiliza. Gostámos
Ao livro juntamos pesquisas em sites (destacamos @gronze.com, @vagamundos.pt e @vive el camino) para definir melhor as Etapas e escolher os locais para pernoitar. Apesar de termos optado por Etapas pré-definidas, que é sempre uma escolha segura, é possível construir o nosso próprio itinerário. A rede de albergues e de serviços de apoio ao Peregrino estende-se por todo o Caminho, o que faz com que os inícios e fins de Etapa possam ser variados, respondendo às nossas necessidades.
Como é que sei que estou no caminho certo? Não há como te perderes no Caminho. Em todos os lugares encontrarás setas amarelas, azulejos com vieiras a indicar o caminho ou marcos com a seta e o número de quilómetros. Se por distração não as vires, não te preocupes… alguém, local ou peregrino, conduzir-te-á pelo caminho certo.


3. Credencial do Peregrino

A Credencial do Peregrino é um documento oficial de identificação individual que permite à pessoa identificar-se como Peregrina. É um “salvo-conduto”, nome que tinha na Idade Média, que permite ao peregrino: 1) ter acesso à rede de albergues municipais; 2) registar os locais por onde passa – deve ser carimbada pelo menos nos locais de partida e chegada de cada Etapa; 3) comprovar o cumprimento da distância mínima de peregrinação para poder obter a Compostela, que é a declaração oficial emitida pela Oficina de Peregrinos da Catedral de Santiago de Compostela.
A Credencial tem o valor de 2€ e pode ser obtida na Oficina do Peregrino ou através de outras instituições autorizadas pela Catedral de Santiago espalhadas por todo o mundo. Pedimos as nossas credenciais pela internet, diretamente no site da Associação Espaço Jacobeus (Confraria de Santiago) em Braga, que nos responderam com um email encorajador, que dizia: “… Não esqueçam, nunca, que “o motivo que nos leva a percorrer o Caminho de Santiago é pessoal. Não existe um motivo certo ou errado, adequado ou não, existe o nosso motivo, aquele que é o verdadeiro para nós!…” (…) Bem haja, bom caminho e… até breve!!!”
Por onde passamos, um carimbo!! Albergues, hostels, igrejas e catedrais, cafés e restaurantes, postos de turismo… O último carimbo é na Oficina do Peregrino, em Santiago de Compostela. Temos uma Credencial rica… de muitas histórias ♥
Nota: se por algum motivo não conseguires obter a Credencial a tempo, não te preocupes. Ao longo do Caminho há Albergues de Peregrinos que têm Credenciais à venda.
4. A Concha ou Vieira

A Concha de Vieira é um dos símbolos, por excelência, do Caminho de Santiago, envolta em lendas e histórias. Não há peregrino que não a leve pendurada nas mochilas ou ao peito. Dizem que só devia ser adquirida em Santiago de Compostela, concluído o Caminho, mas na realidade a Vieira é já parte do Caminho, uma espécie de amuleto de proteção e sorte.
Compramos as nossas num passeio que fizemos a Ponferrada, em Espanha, que é lugar de passagem do Caminho Francês. Coincidência ou não, pareceu-nos uma oportunidade feliz e cheia de significado. Com isto acabamos por não concretizar a nossa ideia inicial, que tinha sido recomendada por uns amigos, e que deixamos aqui como sugestão: comprem vieiras recheadas, façam um bom jantar de comemoração do início do Caminho e, no fim, lavem bem as suas conchas e levem convosco..
Penduradas nas mochilas, inquebrantáveis, foram nossas companheiras. No fim, usando o sentido de uma das suas lendas – que diz que os relevos que enformam a Concha começam em pontos diferentes e terminam no mesmo ponto, simbolizando os diferentes e variados caminhos que existem até Santiago – escrevemos as nossas Etapas e o número de quilómetros feitos.
5. “To do List” do que levamos na mochila

O que levar na mochila era uma das nossas grandes preocupações. Apesar de a regra ter sido reduzir, simplificar e levar apenas o indispensável, apercebemo-nos que ainda podíamos ter levado menos peso. O excesso de peso tem sido indicado como uma das principais causas de lesões. Ambos optamos por mochilas de 40 litros, impermeáveis, com capa de proteção da chuva, de estrutura mais rígida e alças acolchoadas e ajustáveis. Mas o que levar lá dentro? Fizemos uma “To do List”, que partilhamos convosco, agora com alguns comentários, dicas e sugestões.
- Documentação pessoal (Documento de identificação e cartão multibanco)
- Documentação de peregrino (Guia de Santiago, Credencial do Peregrino e a Vieira, que não sendo documentação é um símbolo visível de que és um peregrino para Santiago). À Vieira juntaram-se dois símbolos importantes para nós: o colar indiano japamala, que representa o início do nosso caminho juntos, e o pin com o nome Ir em Viagem que simboliza o projeto de vida que começamos a construir.
- Calçado e roupa
– Botas impermeáveis, já ajustadas ao pé. Optamos por botas de cano baixo para proteger os tornozelos. Além das botas, levamos chinelos de banho e umas sapatilhas bem leves, para descansar os pés à chegada.
– Meias de caminhada. Compra das melhores que puderes. São um investimento valioso que te pode salvar de grandes lesões. Nós levamos quatro pares.
– A roupa (toda ela) deve ser apropriada para grandes caminhadas – de fibra, leve, transpirável e de secagem rápida. Por regra, os albergues estão equipados com máquinas de lavar e secar roupa, ou dispõem desse serviço pago. A regra é levar o mínimo de roupa, ajustando ao número de dias de caminhada e à época do ano. É suficiente: 3 t-shirts, 2 calças (preferencialmente das convertíveis, com pernas destacáveis) ou leggings, 1 calção, 1 polar ou casaco de aquecimento, 1 corta-vento impermeável e 4 peças de roupa interior. Para as mulheres, deixo a sugestão: levem leggings – são práticas, leves, ocupam pouco espaço e fazem uma compressão nas pernas que diminui a fadiga; cuecas de fibra sintética, sem costuras nem elásticos; e soutiens preferencialmente sem alças ou com alças sem costuras, e que não apertem demasiado. Pensem sempre que terão de carregar uma mochila nos vossos ombros, no mínimo seis horas por dia.
- Outro equipamento e acessórios
- Telemóvel – que serve de máquina fotográfica, lanterna, relógio, bloco de notas, GPS ou guia. Nós levamos máquina fotográfica, mas é um peso dispensável caso não se pretenda fazer uma boa reportagem fotográfica.
- Chapéu/ lenço, óculos sol e capa de chuva. Colete refletor, principalmente para quem fizer etapas à noite.
- Cantil de água, cadeado, canivete suiço, sacos plásticos para roupa suja e para lixo, alfinetes d’ama para pendurar a roupa a secar.
- Toalha banho em microfibra e saco cama leve.
- Tampões para os ouvidos ou auriculares… sempre podes adormecer a ouvir música. Se gostares desta ideia, prepara uma play-list para o teu Caminho.
- Barras e bebidas energéticas. Não pesam muito, desaparecem com o tempo e são aquela força extra que precisamos a meio do caminho.
- Caneta de feltro, marcador ou borrona, para deixar mensagens nas pedras do Caminho.
- Diário ou bloco de apontamentos, para ir registando experiências, pensamentos e contactos das pessoas com quem nos vamos cruzando.
- Apesar de não termos levado, o uso de bastões de caminhada parece de grande utilidade, não apenas para dar cadência ao movimento, mas dar equilíbrio ao corpo.
- Higiene pessoal. Este é daqueles tópico que depende muito das necessidades de cada um/a e dos locais onde se vai ficar alojado. Utilize os “Kits de viagem low-cost” e tudo fica facilitado.
- Kit de primeiros-socorros e medicamentos. Preparamos o nosso com base nos conselhos que nos deram, naquilo que fomos lendo, e considerando as nossas necessidades individuais. Levamos: Voltaren (creme e comprimidos), anti-inflamatórios, pensos para bolhas, betadin, creme refrescante para os pés, protetor solar e batom de cieiro. Fica a dica que vick vaporub substitui os cremes refrescantes para os pés, e fica bem mais barato!

- Preparação física. Bem… esta não é para levar na mochila, mas é fundamental para aguentar com a mochila 🙂 A preparação física é essencial para se percorrer bem o Caminho de Santiago e diminuir a probabilidade de ter lesões. Como já praticamos exercício físico, intensificamos a quantidade e regularidade das caminhadas, procurando percorrer trilhos com diferentes distâncias, graus de dificuldade e tipos de piso. Subidas, descidas, terra batida, asfalto ou cascalho. Nem sempre caminhamos com mochila, e isso foi um erro, porque temos de estar preparados/as para caminhar 20km com cerca de 10kg às costas. E preparação mental, é precisa? Querer ir é o segredo.
Nota: Se não quiseres carregar a mochila, há serviços de transporte de mochilas entre Etapas. Os preços rondam os 5€ por Etapa, dependendo do serviço e do número de mochilas. Os contactos destes serviços estão disponíveis em quase todos os albergues (municipais e privados) ou podem ser contratados pela internet.
6. Sete Etapas… sete (novas) oportunidades
Fizemos cerca de 160 quilómetros a pé, divididos em sete etapas. Cada Etapa foi vivida de uma forma muito singular, e por isso decidimos partilhar a nossa experiência em cada uma delas.
Quando nos perguntam: _ o que é fazer o Caminho? _ Ele é muito difícil? A nossa resposta tem sido: o Caminho é como a vida, cheio de tudo… e o segredo está em permitir que o caminho passe por nós. Ele é espelho e reflexo de cada um/a, por isso, as experiências serão sempre diferentes. Os nossos problemas e frustrações, a nossa forma de encarar a vida, as nossas alegrias, desejos e sonhos estarão connosco no Caminho, e vão-se revelando… no obstáculo que conseguiste (ou não) superar, na dor que não te larga, na pessoa que surge para te ajudar (e que tu aceitas ou não!), no encantamento pelas coisas simples, na alegria de finalizares uma Etapa, ou no ressoar de alma que tem o cumprimento Bon Camino. Se nós permitirmos, o Caminho pode ser um mestre exímio em lições de superação, sofrimento, partilha, solidariedade, humildade, gratidão e simplicidade. Por isso, só quem faz o Caminho é que sabe o que ele represente, porque, na realidade, o Caminho está em nós.

Clique em cada uma das Etapas e conheça o nosso Caminho |
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Etapa 1: Ponte de Lima – Rubiães |
Etapa 2: Rubiães – Tui |
Etapa 3: Tui – Redondela |
Etapa 4: Redondela – Pontevedra |
Etapa 5: Pontevedra – Caldas de Reis |
Etapa 6: Caldas de Reis – Padrón |
Etapa 7: Padrón – Santiago de Compostela |
7. A Compostela que certifica o Caminho

No fim, a “Compostela”, que é emitida a todos os peregrinos que apresentem a Credencial do Peregrino ou Credencial do Caminho, devidamente carimbada, e que tenham completado pelo menos 100 quilómetros a pé ou a cavalo (e 200 se em bicicleta) do Caminho de Santiago. Uma vez chegado a Santiago, a “Compostela” pode ser pedida na Oficina do Peregrino, perto da praça do Obradoiro, situada na Rua de Carretas, n.º 33. É um certificado gratuito (só tem de ter paciência para um tempo de espera que pode chegar às duas/ três horas). Podes pedir, também, na hora, um Certificado de distância percorrida, que terá um custo de 3€.
♥
“Não passes pelo caminho…
Deixa antes que o caminho passe por ti!
#caminho Português de Santiago #caminho central #maio2018
Detalhes
Agradecimentos
Atualização das fotografias em março 2021
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